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JAICÓS | Agricultores se animam com primeiras chuvas de 2020 e iniciam plantio

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O mandacaru “fulorô”, o homem do campo segue pela estrada e ao seu lado a linda paisagem, na qual o verde predomina. Acima, nuvens escuras escondem o forte sol que costuma castigar o sertanejo. Os sinais são de que as chuvas chegaram no sertão nordestino.

O semiárido tem dois regimes de chuvas. Na área mais ao sul, elas acontecem entre novembro e fevereiro. No trecho mais ao norte, a água cai entre fevereiro e maio. Mas, no tempo que chegarem elas trazem alegria, principalmente para aqueles que da terra aprenderam a tirar seu sustento.

O instrumento é a máquina ou a enxada. Alguns gostam de colocar o pé na terra, senti-la molhada, outros preferem se proteger dos maliciosos espinhos que podem aparecer pelo caminho, mas todos, com muito amor e dedicação, colocam em prática aquilo que foi herdado dos pais, mas que também pode ser chamado de um dom dado pelo criador.

Na cidade de Jaicós, onde a produção rural ainda é forte, os agricultores se animaram com as primeiras chuvas de 2020 e já iniciaram o plantio. Feijão, milho, mandioca, melancia, abóbora, estão entre os itens semeados e que em breve estarão recheando a mesa de muitas famílias.

A fim de conhecer alguns desses agricultores e mostrar o trabalho realizado por eles, a reportagem do portal Cidades na Net, foi até as localidades Serra Preta e Caldeirãozinho, conheceu diversas propriedades e conversou com trabalhadores do campo.

Nas estradas percorridas, um cenário que alegra o coração daqueles que durante todo o ano esperam ansiosamente pela tão preciosa chuva. A mata verde, terra molhada, lagoas. Na maioria das propriedades, a terra já preparada para receber as sementes que não somente produzem alimento, mas são sinônimos de vida.

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Antônio Manoel de Carvalho Irmão, 65 anos, que reside na “Serra Preta”, planta cerca de 4 hectares todos os anos. “O que faço é só plantar, minha profissão é agricultor. E quando chega o tempo de chuva a gente recebe muito bem, só em esfriar o tempo já melhora muito. E com a chuva já vou cuidando de plantar milho, feijão e também sorgo para fazer ração para os animais. No mês de outubro mesmo deu uma chuva boa e eu já plantei abóbora e já estão verdinhas, estendendo” disse.

Ele disse que sempre que chove o agricultor fica animado. “Hoje arei a terra e vou começar a plantar.  Coloco um trabalhador para ajudar, porque já estou de idade e não consigo fazer só. Penso que 2020 vai ser um ano bom, se Deus quiser. Pode ficar curto, porque a chuva já começou em janeiro, mas creio que vai ser bom sim, sempre que chove o agricultor fica animado” falou.

Apesar de enfrentar algumas dificuldades por conta da idade, seu Antônio diz que continuará enquanto tiver força. “Planto pouco feijão, só para consumo de casa mesmo, porque tenho problema na coluna e para “panhar” é muito ruim. Planto mais milho e o capim sorgo para fazer pasto para os animais. Gosto muito de plantar, enquanto tiver força vou continuar, sempre peço a Deus que me dê coragem para trabalhar, porque é bom” contou.

No Caldeirãozinho, encontramos seu José Otacílio Pereira, 70 anos. Seu neto foi quem nos levou até a roça onde ele estava, que fica por trás da casa da família. Ao chegar, encontramos o agricultor acompanhando atento a aração de sua terra.

Desde os 8 anos de idade, José Otacílio trabalha na roça. “Desde os 8 anos que trabalho na roça, naquele tempo pode dizer que a gente já nascia trabalhando. O tempo que sai da roça foi somente quando passei 9 meses em São Paulo. Mas tirando isso é só na roça direto, não tenho leitura, outra profissão, então é só a roça mesmo”.

Como muitos nordestinos, seu Otacílio conta que viajou para São Paulo em busca de melhores condições de vida. “Aqui a gente via o “aperreio” dos pais e pensava que não dava para ajudar, aí em 76 foi que achava que São Paulo dava uma vida melhor e fui, mas quando cheguei lá o ganho era pouco, de ajudante de pedreiro, então resolvi voltar. Eu tinha 22 anos, passei 9 meses lá. Vim embora e graças a Deus nunca mais precisei voltar lá” contou.

De volta a sua terra, foi da roça, que mais tarde, seu José tirou o sustento para criar os 10 filhos. “Criei 10 filhos só trabalhando na roça e ensinando eles também.  Tem um de 12 anos e outro de 13, mas os demais já tem suas famílias e graças a Deus nenhum passou fome ou “andou nu”. Hoje quase todos trabalham na roça. Tem outras atividades, mas eles só veem vantagem na roça, cada um tem seu pedacinho de terra”.

Para ele, a chuva é sinônimo de riqueza. “Para a gente quando chega período de chuva chega riqueza, porque para quem trabalha na diária aparece serviço, quem não trabalha, está com um “tustãozinho” preparado para “aradar” a terra e quando termina a previsão é plantar, antes do “moiado” ir embora. Planto todos os anos. Já teve época de plantar até 10 hectares, mas hoje planto dois ou três”.

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Ele disse que o prazer do agricultor é ver a terra produzindo. “Para o agricultor o tempo melhor é o inverno, agora a gente já vai plantar, esperar colher, já tem a alegria de ver um pé de melancia nascido, feijão “vingando” e o prazer da gente é esse, ver a produção. E a gente leva a vida assim, meus 10 filhos, criados na roça, até hoje me obedecem”.

Mas, para ele, o agricultor, mesmo com o importante trabalho que realiza, é desvalorizado. “Hoje planto só para consumo de casa, pois não compensa vender porque os preços são lá em baixo. O homem da roça é desprezado, tudo de fábrica é caro e tudo da roça é barato, mesmo sendo um trabalho que abastece todo mundo. O governo sabe fazer tudo, mas o feijão só vem se Deus mandar inverno. Se vier de outro “canto” chega para a gente caro, porque já vem dos ricos. Mas o pobre sempre quando tem, cai” lamentou.

Mesmo diante das dificuldades, o objetivo, segundo ele, é continuar na roça enquanto Deus lhe der saúde. “E enquanto a gente estiver vivo é a roça. Eu agradeço muito a Deus pela minha saúde, porque um homem com setenta anos se não tiver muita saúde não trabalha. Quando era moço trabalhava na roça e cuidava de bicho porque meu pai era vaqueiro. Quando ele morreu o gado acabou, mas a gente continuou na roça. Essa roça a gente comprou sendo vaqueiro, nasci em Geminiano, mas meu pai veio para cá em 56”concluiu.

De volta a Serra Preta, mais uma roça era preparada, a de Francimildo Alves de Santana, 48 anos, que disse que quando chega a chuva já se anima. “Na hora que cai as primeiras águas você já se anima em querer plantar. Tem tempo que o feijão é barato, a gente diz que não vai plantar, mas na hora que o chão molha vem a vontade e não tem jeito. Para o agricultor não compensa vender um saco de feijão por 70 reais, mas a gente tem essa tradição de plantar. Tenho também uma casa de farinha, planto mandioca e todos os anos faço uma farinhada”.

Francimildo, que também herdou dos pais o trabalho na agricultura, teve a oportunidade de se aperfeiçoar. “Trabalho na roça desde pequeno e tenho também minha profissão de técnico agrícola. A gente já trabalhava na roça, surgiu uma oportunidade em Jaicós de fazer esse curso e fiz. Minha roça tem 12 hectares e planto todos os anos cerca de 5, entre mandioca, milho, melancia e feijão”.

A formação técnica contribuiu para o trabalho na sua propriedade e também trouxe oportunidade de prestar serviço a empresas. “No tempo que fiz o curso tinha também o Esnal, mas optei por fazer o curso de técnico agrícola porque achei que era mais importantes para mim, porque desde meu pai que já trabalhava em roça. O curso também foi uma oportunidade de emprego, abriu as portas para mim e de vez em quando trabalho. Às vezes presto serviço para Emater, Agro Amigo, empresa de elaboração de projeto, e assim a gente vai seguindo. Para a agricultura também foi melhor, obtive mais conhecimento sobre plantio e criação de animais. Aprendi muito” falou.

Na agricultura, as mulheres também são protagonistas. Suas mãos não são somente para cuidar dos filhos ou da casa, mas também são instrumentos para cuidar da terra ou de qualquer outra atividade, que elas, com sua força e coragem, se propuserem a fazer.

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Luzinete do Nascimento Carvalho, 51 anos, é uma das diversas mulheres que trabalham no campo. Ela, que também é professora, desde a infância aprendeu o trabalho na roça. “Comecei a ajudar meu pai com 8 anos, já morava na roça e aí eu ajudava a plantar, limpar, na desmancha, em tudo. Eu via pai e mãe plantando e ia ajudar para o serviço “andar mais ligeiro”. A gente vivia só da roça e quando aparecia um dia de serviço era na roça também. A gente plantava só para casa, o que a gente vendia era uma batata de macaxeira e às vezes pai levava umas melancias para a feira, mas como tinha outros também, não conseguia vender tudo, então pai fazia era dar ao povo na rua mesmo” disse.

Na roça onde viveu grande parte de sua infância ao lado dos pais e irmãos, até hoje ela trabalha, por amor. “Sigo o que aprendi até hoje porque peguei gosto, acho bom e enquanto eu tiver condição de levantar a enxada eu trabalho.  Agradeço aos meus pais que me ensinaram e eu nunca esqueci. Planto todos os anos. Se eu ver a chuva cair e não pegar uma sementinha para plantar é mesmo que não está tendo inverno. O que acho é bom é vir para roça, trabalhar com minhas próprias mãos. Não tem história de plantar e colocar outros para limpar, só acho bom se eu mesma vier plantar, limpar, assim que é vantajoso”.

Para ela, não importa se é um homem ou uma mulher, basta a coragem para trabalhar. “Só depende de ter a coragem, se tiver a coragem tanto mulher quanto homem pode trabalhar. O serviço não é bem maneiro, mas também não é tão pesado. Se você estiver com saúde, com a coluna mais ou menos (risos), dá certo. Quem “cata” mais o feijão são as mulheres, os homens fazem mais é limpar o mato”.

Na juventude ela também seguia os passos do pai. O primeiro “salário” que ganhou, “veio da terra”. “Quando tinha 15, 17 anos trabalhei “panhando” feijão para ganhar dinheiro. Pai ia trabalhar na roça e eu ia também, ele ganhava o dele e eu ganhava o meu para comprar minhas coisas. Moramos em Picos e lá a gente plantava também, até arroz. No inverno plantava milho, feijão e na seca verdura, girassol. Um tempo eles plantaram uma tarefa de girassol e era a coisa mais linda” lembrou.

Para ela, não há maior alegria do que quando chega a chuva. “E quando chega a chuva é a alegria maior do mundo, porque já fico pensando que vai ser bom, vou ter o feijão, a melancia. Não tem coisa melhor que um baião com feijão verde, com uma manteiga da terra e carne de porco. Mas se chega o tempo de chover e ela não vem a gente fica triste. Esse ano mesmo demorou e eu já estava ficando triste. Ano passado choveu em dezembro e esse ano só veio em janeiro. Já estava com medo de não ter chuva, mas agora estou pedindo a Deus que continue pelo menos por três meses para que a gente possa colher o que plantou. Bom mesmo é a colheita” concluiu com um largo sorriso no rosto.

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