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Clicks do Mês

JAICÓS | Clicks do Mês de julho retrata a trajetória de luta e resistência de ‘Elisabete’; veja relatos e fotos!

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Uma história formada em meio a dor e dificuldades. Com anos de trabalho duro, divididos entre a roça, a olaria e a produção de carvão, 9 filhos foram criados. Às vezes faltava o pão na mesa, o chinelo no pé, mas por obra divina, aparecia uma mão estendida a ajudar.

Sempre resistindo às mazelas da vida e se fazendo forte mesmo em meio às adversidades, foi que ela seguiu. Em sua trajetória de luta, o amor pelos filhos foi o principal impulso para não desistir.

Maria Isabel de Oliveira, hoje com 69 anos de idade, é a dona dessa história. Ela, que é da cidade de Jaicós, foi a participante do projeto Clicks do Mês, edição de julho, que traz mais uma história de vida que merece ser compartilhada.

Elisabete, como é mais conhecida na cidade, é casada com Antônio Raimundo Veloso, 72 anos, com quem teve 10 filhos: Maria de Oliveira Veloso (Gelciandra), Maria Gelcileide de Oliveira Veloso, Maria de Lourdes de Oliveira, Gernilton de Oliveira Veloso, Géssica de Oliveira Veloso Silva, Gernilvan de Oliveira Veloso (reside atualmente em São Paulo), Gelcissandra de Oliveira Veloso, Antônio de Oliveira Veloso (Gerson – Em memória), Gelcimar de Oliveira Veloso (Em memória) e mais um menino, que morreu 3 dias após o nascimento.

De família simples, dona Elisabete sempre morou no interior e ao se casar, assim permaneceu. “Nós namoramos 10 meses e depois casamos. Moramos 8 meses na Maria Preta, onde o pai dele morava. O pai dele tinha uma propriedade aqui na Lagoa Cumprida e nós viemos praí. Antônio tinha criatório e a gente trouxe muita galinha, ovelha, porco, mas quando a gente chegou aí muitos bichos tiveram fim na BR. Então, começamos a cercar roça, porque toda vida trabalhamos só de roça, nunca dissemos assim ‘nós temos um emprego’. Sofremos muito trabalhando de roça, lá tinha olaria e a gente foi bater tijolo, até quando meus filhos nasceram”.

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Só depois que os filhos alcançaram idade de estudar, o casal resolveu se mudar. “Depois que os filhos foram crescendo tivemos que alugar uma casa na rua para ir para lá colocar os meninos pra estudar. A gente ficava lá e cá, porque tinha a roça e umas criação. Depois de muito tempo, quando meus filhos cresceram, eu quis ir de novo pro interior. Aí fizemos uma casa lá, com muita ajuda batalhei até quando arrumei uma energia pra lá, aí moramos lá muito tempo. Depois que os filhos foram casando, não dava mais pra viver só eu e ele lá, então vendemos lá e construímos essa casa aqui”.

Na zona rural ou na cidade, a dificuldade parecia sempre acompanhar a família. Em alguns dias as panelas estavam vazias, em outros, as crianças estavam de pés descalços.

“A gente viveu uma pobreza que tinha dia que meus filhos faltavam um chinelo. Claudia minha irmã era alfaiate, aí ela dizia ‘olha Elisabete, não deixa esses meninos perder aula. No dia que faltar um caderno, um chinelo, vem a mim que eu dou’. E várias vezes fui até ela e ela dava. Eu não sei lê, então toda vida quis que eles aprendessem. Aí pelejei, coloquei eles ‘tudim’ na escola, e eles vinham de lá no ‘pingo da mei dia’ estudar” conta Elisabete.

Mas diante do sustento que faltava, a família recebia ajuda de pessoas amigas. “Já sofremos tanto que chegou uma altura de ter dia que lá em casa não tinha o que comer. Tinha comadre Inês, que é a mãe de Chico Veloso, que ela passava lá em casa e perguntava o que tinha pra comer, e eu dizia ‘ô comadre, aqui hoje não tem nada, vou já pra rua ‘caçar mei de comprar fiado’. Aí ela dizia não, voltava em casa e trazia tanta coisa pra nós. Ela me ajudou muito. Passei muita necessidade mais meus filhos, mas graças a Deus todo mundo gosta de mim, me conhece e eu achava muita ajuda”.

Com a necessidade que sempre batia à porta, o pouco que surgia se tornava muito. Assim aconteceu quando a família soube que receberia um pequeno auxílio de 15 reais.

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“Quando foi um dia eles chegaram de lá ‘tudo alegre’, dizendo que ia ter um ganho, um bolsa escola, e que a diretora mandou ir lá. Aí eu fui na escola, mas duvidando, achando uma coisa difícil. Mas a diretora fez uma reunião com as mães e explicou. Era só três crianças e eu podia colocar até os 4. Ainda hoje lembro, era 15 reais por criança todo mês, mas eu fiquei muito feliz com esse ‘gainho’, porque a gente passava muita necessidade. Eu fazia feira com esse ganho, 15 reais ainda era dinheiro naquele tempo. E meus meninos nunca ‘arengavam’, eu tirava o dinheiro deles e usava para o que precisava. Ainda cheguei a comprar um colchão, que eu não tinha, dormia numa cama dura, com esse dinheiro aí”.

Um dos trabalhos duros que dona Elisabete enfrentou, para poder garantir comida na mesa, foi na produção de tijolo comum. “Aí, na dificuldade, disse assim ‘Antônio, vamos bater tijolo. E ele ‘mulher nós não bate, e eu, bate sim, eu e os meninos. Aí fomos para a olaria […]. No outro dia levantei com o escuro. No 1º dia batemos 500 tijolos até 10 h, fomos pra casa, e depois voltamos de novo. No outro dia batemos 600, até que fizemos uma caeira de 12 milheiros de tijolo, tudo batido por minhas mãos e de minhas filhas. Eu e Antônio fomos tirar lenha, carregando nas costas. Queimamos o tijolo e quando eu vendi fiz uma feira grande das ‘coisas em grosso’. Porque hoje a gente tem condição de ir no comércio fazer uma feira, mas antigamente era ‘quilinho’ de coisa no maior sofrimento”.

Ela diz que a vida antigamente era muito mais difícil. “Eu sofri muito para criar meus filhos. Hoje o povo diz que a vida é difícil, mas não é. Difícil foi o que a gente já passou. Serviço lá em casa quem enfrentava mais era eu, Antônio trabalhava mais era na carroça, mas lá no interior era fraco, só dava aqui. E a gente passava necessidade, Elisângela e Otávio era que davam feira pra mim, devo muito favor a eles”.

Além de todos os obstáculos que enfrentou, Elisabate ainda teve que passar por um ainda pior: a dor de perder um filho. Ao falar dos filhos que se foram de forma tão cruel, mesmo a tamanha beleza de seus olhos verdes, não escondia o rastro de tristeza que surgia em seu olhar ao relembrar de todo sofrimento que passou.

A primeira grande dor veio quando sua filhinha, de apenas 4 anos, morreu atropelada. “E sofri muito também por ter perdido meus dois filhos. Minha menina que morreu atropelada com 4 anos era do tipo que não saia de perto de mim. A gente morava aqui na rua, perto de onde hoje tem o matadouro. Do outro lado da pista tinha um lugar que nós cavava umas cacimba, aí ela tava brincando ‘no oitão’, e os meninos foram sair e ela disse que ia com eles, mas eu nem ouvi, porque estava na cozinha. ‘Quando dei fé lá vinha os dois meninos morrendo de chorar’. Ela ia atravessando a pista, ai viu o pai e correu pra encontrar ele, aí vinha um carro rápido e quando o motorista viu a menina freou, o carro rodou e bateu nela e ela caiu morta nos pés de Antônio. Ele ficou louco, ainda saiu correndo atrás do carro com uma pedra […]”.

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Quando perdeu a filha ela estava grávida e pelo estado em que ficou após a tragédia, o médico temia pela sua saúde e a da criança. “Quando ela morreu eu fiquei ruim. No tempo eu tava grávida e Dr.Raimundo dizia ‘é perigoso essa criança não nascer normal. Deus deixou a senhora grávida pra dar outra no lugar dessa aí, a senhora tem que tentar esquecer. Mas eu quase enlouqueço no tempo. Ainda tem um menino que morreu com 3 dias de nascido e tive dois abortos. Passei muita coisa triste, só sou viva ainda pelos milagres de Deus”.

Anos depois, seu coração foi novamente partido por mais uma tragédia. “Quando foi com muitos anos mataram o meu filho mais velho e foi outro abalo grande pra mim. Eu fiquei de uma maneira que passava dias e não comia nada, fiquei bem magrinha. Aí minha irmã e meu cunhado foram tudo para mim. Minha irmã todo dia descia até duas vezes lá em casa e levava bolo, almoço, mas eu pelejava e não comia, foi muitos dias assim. Aí minha irmã me levou no médico, ele passou uns remédios e disse ‘esses remédios são caros, a senhora tem condição de comprar?’. E eu não tinha uma pequena condição nesse tempo, tinha era gente que ia lá em casa e levava feira, me dava dinheiro”.

Ela lembra que após a perda do filho foi ajudada por muitas pessoas, as quais ela, com certeza, será eternamente grata. “Aí Claudia pegou a receita, e nesse tempo ficava muita gente sentada ali na casa de seu Zé Melé, aí ela foi lá com a receita e pediu ajuda, e todo mundo disse ajudou. Eu devo muito favor aos ‘Melé’. E eles disseram ‘olha Claúdia, se esse dinheiro não der pra comprar tu torna vir a nós que a gente dá mais’. Aí foi 10 injeção que tomei na veia, com 2 tipos de remédio. Eu vinha todo dia no hospital. A última injeção eu tomei no pé, porque não achava mais veia, eu tava bem magrinha. Até que foi indo e fui me levantando, mas passei foi tempo sem trabalhar”.

Apesar de tudo que viveu, ela diz que agradece a Deus pela proteção, pois muito fez enquanto pôde. “Nesse tempo a gente trabalhava fazendo carvão. Antônio tirava lenha no mato, eu ajuntava, a gente colocava na carroça, trazia pra casa e fazia as caeira. De madrugada a gente levantava uma a duas vezes pra olhar se não tinha furado. Fiz muito carvão. Tinha gente que brigava ‘tu vai adoecer’, mas pela idade que eu já tenho, Deus tem me protegido. Quando eu era nova fiz muito ‘arco’, nunca soube esperar por ninguém. No resguardo eu lavava roupa, varria casa e graças a Deus, pela idade que eu tenho, ainda me acho sadia” diz ela.

Hoje, Dona Elisabete ainda sofre ao relembrar os tempos difíceis que viveu, mas demonstra grande gratidão a Deus pelos filhos que tem. De cada um deles, ela fala com orgulho e diz que os filhos sempre foram batalhadores. Sem dúvida alguma, muito eles aprenderam com o exemplo da mãe.

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Veja os Clicks da forte Elisabete e sua família: 

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