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Lugar de histórias e belezas: conheça um pouco do povoado Peixe, em Massapê do Piauí, e veja imagens exclusivas!

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Uma terra de belezas, riquezas, histórias, encantos. Em um só canto o criador juntou inúmeras maravilhas e fez de um pequeno e simples povoado, um lugar de grandes fascínios. Quem visita o povoado Peixe, se deslumbra a cada passo dado e tem os olhos inundados de alegria ao observar cada traço perfeitamente formado.

Localizado no interior de Massapê do Piauí, o Peixe é um lugar tranquilo e acolhedor. A paisagem é marcada pela presença da árvore símbolo do estado do Piauí, a carnaúba ou carnaubeira. Conhecida como “árvore da vida”, no povoado ela faz jus ao nome. Traz vida ao local com sua beleza imponente e há muitos anos é responsável pelo sustento de famílias.

Mananciais também passam pelo povoado. Os Rios Boa Vista e Boa Esperança molham a abençoada terra e desaguam bem no centro do povoado formando a graciosa “Lagoa do Peixe”, que em todo entardecer, junta-se ao pôr do sol para formar um espetáculo de encher os olhos.

Entre as carnaúbas e na beira da lagoa diferentes pássaros cantam e encantam. Famílias que moram ao redor da lagoa se reúnem nas calçadas para prosas e risadas. Os animais das “criações” passeiam livremente. As carnaubeiras não são as únicas no local, algumas árvores nos remetem a infância, outras, frondosas e com seus galhos entrelaçados, nos deixam admirados e a refletir.

Quem também traz graça ao local são os morros, pelos quais o povoado é cercado. Os belos paredões, em seus diferentes tamanhos e formatos, produzem uma visão de tirar o fôlego. O destaque é para o Morro do Mocergo, e especialmente, o Morro do Pico, principal do local, que pode ser visto de vários pontos.

De certo local do Morro do Pico, até onde a equipe do Cidades na Net conseguiu ir para registrar, a visão já é deslumbrante. Do topo então, deve ser ainda mais magnífico. Mas poucos conseguiram ter o privilégio e a coragem de subir ao topo do “Morro do Pico”. A primeira pessoa a realizar o feito, há cerca de 60 anos, foi um homem conhecido como Manoel de Oiô.

Passado todo esse tempo, neste ano de 2020 mais duas pessoas conseguiram escalar o morro.  Os jovens José Erisvaldo de Sousa Carvalho, conhecido como Valdin de Zé Preto Firofa e Neilson Coelho Carvalho, foram os desbravadores. Do topo do morro, a uma altura de cerca de 150 metros, eles registraram o momento.

Histórias

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O Peixe também é uma terra que guarda muitas histórias. Vários traços delas infelizmente se perderam no tempo, mas conseguimos alguns relatos sobre o Peixe de antigamente, seus primeiros moradores, o sofrimento, luta e força de seu povo.

O senhor Júlio Boaventura da Costa, 74 anos, nascido e criado no Povoado Peixe, foi quem nos relatou sobre o povoado. Antes o local era uma grande fazenda, a “Fazenda Data Peixe”. De muito longe veio a primeira família a habitar no local. O “Tenente Chico do Peixe”, seus filhos e os 12 escravos que a rica família possuía.

“Eles vieram de Portugal, mas não sei se eram de outro lugar. Aí eles vieram para São Paulo e depois ficaram em Petrolina. Eles eram ricos. Aí acharam essa fazenda aqui e vieram. Tinha a casa grande, da fazenda, e a casa dos escravos. Minha vó foi criada lá, pois minha bisavó era filha de escravo” conta seu Júlio.

A Casa Grande, como os moradores chamam até hoje a casa da fazenda, foi construída pelos escravos. Seu Júlio lembra alguns detalhes. “Na casa velha as ‘furquia” eram grossas e os caibros eram uma carnaúba completa. Os enchimentos eram carnaúbas amarradas com rei de couro de boi. As paredes também eram grossas, tudo construído pelos escravos. Meia porta da casa grande só dois homens “arribavam”. Ali do outro lado também tem um tanque quase do tamanho dessa lagoa, que também foi cavado pelos escravos”.

Da casa, sobraram poucas coisas para contar sua história. Seu Júlio mostrou algumas chaves que ele ainda guarda. No local onde ela ficava, hoje restam apenas alguns destroços de telhas e tijolos. No lugar, ainda há também dois pedaços de madeira ainda fincados no chão, assim como igualmente estão cravadas naquela terra, lembranças de um povo que lá viveu.

O Peixe também foi cenário de mistura entre povos. Segundo seu Júlio, senhores e escravos passaram a formar uma só família, após os filhos do tenente casarem-se com filhas de uma escrava chamada Brarda. “Aí aqui tinha uma velha chamada Brarda, que era uma das escravas e tinha “um bocado” de filhas. Aí os filhos do tenente casaram com filhas dos escravos. Então, como virou família, começou a “maneirar a barra” dos escravos. Aí aos outros escravos eles foram dando terras”.

Após a morte do tenente, os filhos dividiram a terra com os 12 escravos. “Quando o velho morreu ficaram os 12 escravos, aí foram dividir, 6 para cada filho. Mas como a velha e os escravos já estavam no meio da família, eles decidiram dar um pedaço de terra a cada um para eles trabalharem por conta própria, aí eles foram ficando. Eles tinham 3 mil hectares, aí foram dando terra para os escravos e ficaram só com 1500 hectares. Aí os velhos foram morrendo, eles ficaram sem escravos e começaram a vender gado, terra. Eles não iam trabalhar, já tinham liberado os escravos, então foram vendendo para se manter, até que venderam tudo” disse.

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Matilde Alzira dos Santos, que faz parte de uma das primeiras famílias a residir no povoado, contou que seu pai, João dos Santos, chegou a morar em uma casa que a escrava Brarda viveu. “Nós somos uma das primeiras famílias que veio morar aqui. Eu não conheci nenhuma delas, mas sei que a mãe da minha avó já era daqui. Aqui era Brarda e Martina, depois veio “padrim” Chicô e depois dele começou a gerar nossa família. A “veia” Brarda era uma nega do cativeiro, ela morava em uma casinha de taipa de quatro cômodos. Sei que meu pai ainda chegou a morar nessa casa com minha avó”.

No povoado, as famílias trabalharam durante muitos anos com o algodão. Matilde lembra que o pai distribuía as sementes para povo. “A gente trabalhava de algodão, carnaúba, milho e feijão. Meu pai tinha uma roça na Chapada do Jaburu e plantava macaxeira. Ele plantava algodão e espalhava sementes para todos os vizinhos. Ele comprava as sementes, distribuía e esperava para quando o povo pudesse pagar. Mas depois de um tempo veio a praga do bicudo e acabou com tudo, ninguém plantou mais”.

Pelo que a filha relatou, seu João, além de um homem muito trabalhador, era de uma bondade imensa. Em lágrimas, Matilde lembrou que o pai ajudava as pessoas. “Desde criança que via meu pai labutando com tudo, com cera, algodão. Ele tinha uma “vendinha” e distribuía comida para todos os pobres, não importava o tempo que fosse pagar, toda vida era assim. Daqui para Massapê, Simões, Picos, Araripina, pra todo canto ele ia. E no começo era através de animal que ele ia, de jumento, e vendia nessa região toda. Todo mundo vinha fazer negócio com ele” disse.

Após a “praga do bicudo”, que extinguiu o trabalho com algodão, a carnaúba passou a ser a principal fonte de renda das famílias do povoado. Até os tempos de hoje, diversos moradores do Peixe ainda exercem a atividade, que tem perdurado por gerações.

Matilde disse que criou os filhos trabalhando com a palha de carnaúba.“Hoje não trabalho mais, mas trabalhei muito na carnaúba. Depois que tive meus filhos, para criar eles eu ia para o mato cozinhar para os trabalhadores, ‘rendar’ palha. Depois que fazia o apuro do pó a gente acertava com os trabalhadores. Andei por Angical, Maria Preta, Patos, tudo tirando carnaúba para sobreviver. Levantei minha casa trabalhando na palha” conta.

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Seu Júlio também exerceu a atividade. “No tempo dela a carnaúba dura só 4 meses, daí para frente quem quiser que se vire. Você tem que criar um bode, uma galinha, para quando acabar a palha ter com o que viver. Trabalhei muito com carnaúba, arrendando, tirando. Eu já estava acostumado, então achava bom. Aparei palha nesse Peixe todinho. Naquele tempo tinha o aparador, o enfiador, o amontoador, eram 4 pessoas trabalhando. Mas agora são só duas pessoas” disse ele.

Peça usada por seu Julio no trabalho com a carnaúba

Sobre o povoado, eles também resgataram lembranças da Lagoa do Peixe. Seu Júlio contou que a família Reis, que se tornou proprietária de terras no local, marcava pescarias na lagoa. “Quando aqui tinha muito peixe quem mandava era Odilon Reis e o irmão dele, Antônio Reis. Quando ele vinha aqui ninguém pescava, era cercado. Ele cercava tudo e depois marcava uma pescaria e aí era dois dias de festa. O povo vendia batata, bolo. Não era só peixe. Tinha cachaça, briga (risos). Era uma época boa, em meados de 65”.

Matilde disse que a água de lá era usada para tudo. “A gente fazia tudo na lagoa, no tanque. No período de setembro a novembro quando secava toda água de poço a gente ia lavar roupa lá no rio de cacimba” destacou.

A mãe de Matilde, Alzira Alves dos Santos, também nos falou de suas lembranças.“A vida aqui tinha seus tempos bons, outros mais agoniados, de trabalho, luta. Aqui a gente trabalhava em tudo, mas o que tinha muito de primeiro era algodão, o apelo era esse, a família toda trabalhava. Mas aí apresentou aquele negócio do bicudo, acabou o algodão e o que ficou pra nós foi a palha. A primeira pessoa que começou a arrendar palha aqui foi o João”.

Dona Alzira contou que o marido, seu João, enfrentava longas viagens a trabalho. “Ele levava a palha no jumento daqui para Araripina e ia de pé. Quando voltava vinha trazendo os cereais dos comerciantes daqui. A cera ele levava para Picos tudo a pé. Nessas viagens ele saia daqui na quarta-feira e só chegava aqui de volta no domingo de noite. As vezes uma viagem era boa, outra era ruim, mas dava para ir sobrevivendo”.

Ela disse que os 13 filhos foram criados do trabalho com a palha. “Os 13 filhos, mais um neto que criei, foram criados através desse trabalho. Ele pelo mundo e a gente por aqui fazendo as coisas. Ficava cuidando da casa, dos trabalhos, colocando os filhos para trabalhar. Tem a lagoa também que a gente utilizava a água para tudo, a gente abria buraco na beira da lagoa para pegar água pra beber” falou.

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As palavras finais de dona Alzira e seu Júlio, foram de amor pela terra que os abriga:

“Para mim não tem lugar melhor para morar que no Peixe. Eu nasci em Jaicós, fui para a Ingazeira, papai morou lá 12 anos, depois eu casei e vim para cá e para mim não tem lugar melhor que esse. A minha família quase toda mora aqui. Aqui eu gosto de tudo. Eu coloco a cadeira aí na calçada e passo o dia vendo o povo e a água, para que melhor que isso” Alzira Santos.

“Por onde já andei, não achei lugar melhor. Já estive em São Paulo “um bocado de ano”, já andei para os lados do Maranhão, passei foi tempo em Pernambuco trabalhando, mas não tem um lugar melhor que o da gente. Tem lugar bom, mas é dos outros. No lugar da gente conhecemos as pessoas, confiamos mais, tem mais tranquilidade. Além da tranquilidade ainda moro em frente a uma lagoa dessa. Para mim é o lugar melhor que acho para morar” Júlio Costa.

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