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POLÍTICA

STF adia decisão sobre o orçamento secreto para a próxima quarta-feira

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Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) começaram a julgar, nesta quarta-feira (7/12), se a Constituição permite a destinação de bilhões de reais em verbas públicas para emendas parlamentares com pouca transparência, que ficaram conhecidas como “orçamento secreto”.

Oficialmente chamados “emendas de relator”, esses repasses viraram moeda de negociação política do Executivo com o Legislativo ao longo do governo de Jair Bolsonaro (PL), e o Orçamento do ano que vem prevê o empenho de R$ 19,4 bilhões para esse fim.

O julgamento começou pelas sustentações orais de advogados das partes e foi interrompido pouco antes das 18h30 pela presidente da Corte, ministra Rosa Weber, devido ao adiantado da hora. Ela marcou a volta do julgamento para a quarta-feira da semana que vem (14/12). Quando o assunto for retomado, os ministros vão decidir se o Poder Legislativo pode definir como gastar essa verba sem que as despesas estejam necessariamente vinculadas a políticas públicas formuladas por ministérios e outros órgãos do Executivo.

A reclamação nas ações em pauta, apresentadas por PSol, PV, Cidadania e PSB, é que falta transparência nessas emendas, não ficando público quem libera e sobre quais critérios. Para os autores dos processos, as emendas sem transparência e usadas para agradar aliados ofendem os princípios da transparência, da publicidade e da impessoalidade, que estão previstos na Constituição.

Essa falta de transparência já levou a desvios de verbas identificados em investigação da Polícia Federal. Um esquema revelado em outubro deste ano expôs que prefeituras de cidades pequenas do Maranhão mentiam sobre a quantidade de atendimentos médicos para ter acesso a mais recursos.

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Algumas localidades informaram que cada médico da cidade faria, em média, 450 consultas por dia, o que é impossível. Por causa desse esquema, R$ 78 milhões foram bloqueados nas contas das prefeituras de 20 cidades e até hoje não se sabe quem liberou as verbas – pois isso ficou oculto.

As idas e vindas do orçamento secreto

O que veio a ser conhecido como orçamento secreto nasceu em 2019 com o nome de “emendas de relator”, ou “RP-9”. Tratou-se de uma investida do Legislativo federal sobre verbas que antes eram manuseadas por órgãos do Poder Executivo. Emendas parlamentares sempre existiram, mas no orçamento secreto os repasses foram ficando cada vez maiores e mordendo mais e mais o orçamento do governo federal.

Pressionado sobre o tema ao longo da campanha presidencial de 2022, o presidente não reeleito Jair Bolsonaro (PL) costumava dizer que não tinha poder sobre o orçamento secreto e que inclusive era contra, tendo vetado o dispositivo em 2020. Trata-se de uma meia verdade, pois ele realmente vetou, mas, após pressão dos parlamentares, restituiu o orçamento secreto por lei.

Bolsonaro vetou o orçamento secreto quando sancionou o Orçamento de 2020 e os parlamentares até tentaram derrubar o veto, mas não conseguiram por falta de votos. Ainda em 2019, após negociação com os líderes do Congresso, o então ministro da Secretaria de Governo, general Luiz Eduardo Ramos, mandou Projeto de Lei ao Congresso recriando as emendas vetadas. O texto foi aprovado em votação simbólica no Congresso.

E mesmo com o orçamento secreto tendo virado lei, o governo federal continuou tendo poder sobre as liberações, como mostra o recente bloqueio imposto por Bolsonaro, que coincidiu com um acordo entre Arthur Lira e o PT do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva.

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A questão já foi discutida na Justiça e o orçamento secreto chegou a ser proibido, mas a pressão dos parlamentares venceu mais essa batalha. No final de 2020, a ministra Rosa Weber proibiu em liminar a continuação da distribuição das emendas sem transparência. Meses depois, porém, cedeu a pedidos dos presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), e recuou da proibição, definindo que os repasses podiam voltar se tivessem mais transparência.

Essa decisão, porém, jamais foi cumprida integralmente pelo Congresso. Após a decisão, cerca de 400 parlamentares enviaram documentos que os vinculavam à liberação de verbas do orçamento secreto, mas esses dados abarcaram menos de um terço dos R$ 37 bilhões liberados no período. Os quase R$ 20 bilhões restantes seguiram secretos.

O julgamento desta quarta

A análise dos processos começou com uma apresentação da relatora, ministra Rosa Weber, e foi interrompida pelo intervalo para o cafezinho.

Na volta, advogados de partes interessadas fizeram suas sustentações orais. Os defensores dos partidos reforçaram os argumentos das ações, e os advogados da Câmara e do Senado, além do advogado-geral da União, defenderam a legalidade das emendas de relator.

“O texto constitucional não veicula mandamento proibitivo à criação de mecanismos que ampliem a influência do poder legislativo sobre a execução orçamentária”, argumentou o AGU, Bruno Bianco, em nome do governo federal.

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Representantes de entidades da sociedade civil também puderam se manifestar. Foi o caso do advogado Marlon Reis, do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral. Ele, que é o idealizador da Lei da Ficha Limpa, disse que o orçamento secreto fere cláusulas pétreas da Constituição e “nasceu da fragilidade de um presidente da República, que, não tendo aptidão para governar, desistiu de tentar e delegou os rumos da nação ao Congresso”.

Ainda segundo Marlon Reis, Bolsonaro, ao facilitar o orçamento secreto, “oficializou um mensalão desavergonhado, fratricida e lesa-pátria”.

Em nome da Procuradoria-Geral da República (PGR), falou a vice-procuradora geral, Lindôra Araújo, que defendeu a legalidade do modelo de emendas de relator.

Ela criticou os discursos dos críticos ao orçamento secreto, que chamou de “políticos”. “Aqui estamos falando da transparência das emendas de relator, que foi garantida. Não estamos falando de eventuais ilícitos”, argumentou.

Bom ou ruim para o futuro governo Lula?

Na campanha, o presidente eleito Lula atacou várias vezes o orçamento secreto e disse que sua manutenção significaria o fim da governabilidade para o Executivo. Para seu futuro governo, portanto, uma decisão do Supremo tornando o dispositivo inconstitucional parece positiva.

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Na prática, porém, uma decisão ainda nesta quarta que acabe com as emendas de relator pode atrapalhar – e muito – a negociação do futuro governo com a atual legislatura no Congresso pela aprovação da Proposta de emenda Constitucional (PEC) da Transição. A aprovação do texto é fundamental para a abertura de espaço fiscal para que Lula possa cumprir alguns de seus principais compromissos de campanha: manter o Auxílio Brasil (que voltará a se chamar Bolsa Família) em R$ 600 anuais e dar aumento acima da inflação para o salário mínimo.

Líderes do Congresso estão mandando “alertas” aos articuladores petistas sobre o efeito devastador que uma decisão considerada negativa teria no “humor” dos parlamentares.

Lula e seus aliados não têm poder para tirar ou pautar ações no STF, mas os magistrados da Corte também têm lidado com a pressão e podem adiar sua decisão. Essa pressão é o que tem impedido o Supremo de se debruçar sobre um tema tão em destaque no debate público.

O resultado do julgamento é imprevisível, apesar de vários ministros terem críticas conhecidas ao orçamento secreto, como a própria Rosa Weber, além de Luís Roberto Barroso, Carmem Lúcia e Edson Fachin.

Há ministros com mais intimidade com o mundo político, como Gilmar Mendes, que defendem que a Justiça espere mais por uma solução política e deixe Executivo e Legislativo buscarem uma solução para dar mais transparência a esses repasses a partir do ano que vem.

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Há a chance, portanto, do julgamento recomeçar na semana que vem, mas ser paralisado por um pedido de vista (mais tempo para analisar o processo).

Fonte: Metrópoles

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