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Belém do Piauí

Conheça a história Manoel Jucelino, conhecido sanfoneiro que perdeu o braço e a perna e hoje vive em uma rede

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No mês de janeiro, quando acontece a tradicional Festa de Reis, celebrada oficialmente no dia 06 de janeiro, o portal Cidades na Net conta a história de um dos ícones do reisado na tríplice fronteira dos municípios de Campo Grande do Piauí, Belém e Vila Nova do Piauí.

Nascido em 28 de junho de 1954, Manoel Jucelino Leal tem 67 anos de idade e 53 como tocador de reisado. Reside na localidade Morrinhos, situada zona rural do município de Campo Grande do Piauí. É casado com Maria Soledade de Araújo Leal e pai de Solismária de Araújo Leal.

Manoel despertou sua paixão pela sanfona desde criança, seguindo o exemplo do pai, o saudoso Jucelino. Foi um autodidata. Aprendeu a tocar no instrumento do pai. “Comecei pegando a sanfona de meu pai escondido, pequeno, com nove anos. Ele ia trabalhar na roça e eu pegava a sanfona. A mãe sabia, mas acobertava. Aprendi sozinho, só eu e Deus. Depois ele ficou sabendo e até se conformou. Sabia que eu tocava melhor que ele mesmo. [risos]”, relatou.

As primeiras apresentações foram na companhia do pai, nas farinhadas. Depois, aos 13 anos, começou sua história como tocador de reisados na região. “Sanfona minha conversava bonito em reisado. O povo ficava besta, porque eu toco mesmo. Eu fiz foi aprender. Logo eu tinha vontade.”, disse envaidecido.

O grupo andava a pé, com ajuda de um jumento. “Ia pra Queimada, São João, São Bento… Dormia lá mesmo. Dei muita despesa a gente rico, mas nunca passei fome.”, disse.

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A sua fama de bom tocador de sanfona foi crescendo e Manoel passou a tocar forrós nos interiores, se tornando um dos artistas mais solicitados da região. O repertório era composto, principalmente, pelas músicas de um ídolo, Luiz Gonzaga. Depois de um tempo conseguiu juntar dinheiro e comprar sua própria sanfona, mesmo pequena e bastante usada.

Manoel se tornou uma das figuras mais representativas da cultura popular nos municípios de Campo Grande do Piauí, Belém, Vila Nova do Piauí e até Padre Marcos, onde a tradição do reisado se mantém viva e forte. Recebeu homenagens em eventos culturais de Vila Nova do Piauí e Belém do Piauí pelo trabalho realizado em prol da cultura.

Anualmente, no mês de dezembro, vários grupos se formam e percorrem os lares de diversas famílias levando dança, músicas, poesias e muita alegria.

Para Manoel, que por conta dos problemas de saúde já não pode mais participar dos reisados, esse é um dos períodos mais difíceis do ano. “De primeiro era a saudade. Hoje eu faço é chorar mesmo. Quando eu lembro as cassa onde eu brincava (o reisado), eu choro. Só falta é não parar.”, disse.  

O sanfoneiro enfrentou problemas graves de saúde e, por uma questão de sobrevivência, teve que ser submetido a duas cirurgias que resultaram na amputação do braço esquerdo e a perna direita. Hoje, segundo relatou o próprio Manoel, ele não vive um dos melhores momentos da vida.

“Minha vida hoje não tá boa não. Mas pior já teve. Era doente, morrendo, gritava noite e dia. Passei de quatro meses gritando de dor. Não tinha remédio que desse jeito.”, contou.  

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Em uma longa entrevista marcada por risos e lágrimas, Manoel relatou um pouco da sua história de vida, do sofrimento, das superações, das amizades.

Há mais de cinco anos faz hemodiálise três dias na semana, em Picos. “Eu comecei ir pra hemodiálise numa cadeira de rodas. Eu pensei que ia era morrer. Mas aí foi indo, foi indo e depois de um tempo eu já ia era caminhando.”, contou.  

Em 2019, Manoel conta que machucou o braço, e por conta da diabetes, o ferimento se agravou e ele sentia dores constantes. “Doía muito. Aí eu pagava o carro e andava, ganhava o mundo, me distraía, mas a dor sempre danada.” No dia 17 de dezembro de 2020, Manoel teve que ser submetido a primeira cirurgia de amputação do braço, que durou cerca de duas horas.

“Eu tive um alívio grande. Perdi um braço, mas não sentia mais dor.”, destacou Manoel.

Cinco meses depois um novo problema. Manoel feriu uma perna num carro, que causou Erisipela, um processo infeccioso da pele, mais comum em diabéticos. “Foi só piorando. Criou uma capa preta. Dr. Tico tirou. Fez de tudo pra não tirar a perna. Mas não teve jeito. Dr. José Almeida teve que amputar.”, disse. A cirurgia feita dia 04 de agosto de 2021.

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Para Manoel, lidar com a perda da perna foi bem mais difícil. “Sem o braço eu saía, andava de carro. Mas agora eu não ando mais pra canto nenhum. Não tem como caminhar. Pra um homem que já andou muito, que já tocou e dançou forró, e hoje fica só deitado numa rede e dependendo dos outros pra caminhar, pra ir pra o banheiro. Só quem vive sabe o tanto que é ruim.”, lamenta ele.  

O sanfoneiro, que sempre teve uma vida ativa, vive aos cuidados da família. Passa o dia e a noite em uma rede que foi armada na primeira sala da casa, com vista para o terreiro e uma estrada vicinal. Seu principal companheiro é o único neto, Vitor, que além de fazer companhia, lhe ajuda no uso da medicação diária nos horários indicados. “Minha sorte é esse menino.”, faz questão de falar o avô.

Manoel conta que as noites se tornaram duradouras. “Parece que a noite não termina. Dá é agonia. Minha vontade é do dia amanhecer logo, porque aí eu pelo menos tô ouvindo uma vaca berrando, um galo cantando. Eu me distraio.”

Apesar do sofrimento, Manoel tem muita gratidão no coração. “É difícil, mas eu tô satisfeito porque não sinto mais dor. Essa dor no braço, na perna, era a coisa pior que tinha. Ela incomodava a gente toda hora, todo minuto, todo dia. Na hora que você dorme um sono, quando acorda ela tava beliscando, judiando.”, disse.

Chorando, Manoel dirigiu agradecimentos a Deus e lembrou dos amigos. “Eles apareceram nas horas que eu mais precisei. Gostei muito da minha família, dos amigos daqui e de fora. Agradeço muito. Tudo eu gastei 13 mil, e foi mais os amigos que me deram.”, disse, relatando que já não tinha mais condições financeiras de custear os tratamentos de saúde. “Já vinha gastando muito com a hemodiálise. Ficou caro depois que a gasolina subiu. Antes, com 50 reais dava pra ir em Picos e voltar. Mas a gasolina foi subindo e a viagem ficou muito dependiosa.”, falou.  

Apesar das dificuldades físicas, às vezes, Manoel ainda dá um jeito de matar a saudade dos tempos em que tocava sanfona. “Assim mesmo eu teimo. Eu tenho uma sanfona aí e ainda toco um bendito, uma valsa, as músicas do reisado. É devagar, mas eu tento. Ainda lembro de tudo.”, diz ele.

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