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Alegrete do Piauí

Em Alegrete do Piauí, Clicks do Mês conta a história de Fátima, mãe e mulher de lutas; veja fotos e relatos!

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Numa pequena e simples casa no interior, construída com muito suor, ela viveu parte de sua vida. Os quatro cômodos da moradia, guardam lembranças de dias de luta. Lá, ainda estão o fogão de lenha, os potes de barro, livros velhos, algumas roupas de uma pessoa amada que partiu.

Em cada canto ao redor da casa, uma memória do passado. O umbuzeiro, a grande pedra onde as crianças brincavam, o riacho, o poço onde ela ia para lavar roupa. Na verdade, ainda na estrada, antes mesmo de chegar ao local onde ela viveu com a família, as lembranças já invadem a mente, pois aquele chão, guarda marcas de seus pés.

Ela ? é Maria de Fátima Sousa. O local? a pequena localidade Maniçoba, situada na zona rural de Alegrete do Piauí, a mais de 6 km da sede do município. Foi até lá que o Cidades Na Net chegou para contar mais uma história através do projeto Clicks do Mês.

Maria de Fátima, hoje com 54 anos, é mãe de três filhos, Francisco Kelson de Alencar, o primogênito, e Iago Sousa Rodrigues e Ana Patrícia de Sousa Rodrigues, estes dois últimos, frutos do casamento com Manoel Francisco Rodrigues, que faleceu há 14 anos.

Na Maniçoba, Fátima viveu parte de sua trajetória ao lado de Manoel e os dois filhos do casal. “Lá a casa era pequenininha, passamos muito tempo trabalhando pra fazer ela. Um quarto que fiz depois, eu tive que vender as ovelhas pra levantar. Era tudo simples, não tinha energia, a água era de pote, fogão à lenha. E tinha as vezes que eu ficava sozinha em casa, só com um clarinho de lamparina. Trancava as portas e ficava com medo. Lá era muito isolado, mas era a terra da gente. Eu ainda adoeci lá, enfrentei uma depressão, era muita dificuldade” lembra ela.

O sustento da família vinha da roça, além de 80 reais do Bolsa Família. “Foi difícil, mas criamos todos os dois, graças a Deus. Manoel trabalhava de roça e eu cuidava da casa. Tinha um cartãozinho Bolsa Família que ajudava. Quando o inverno era bom dava muito feijão, melancia, abóbora, a gente vendia. Mas quando o inverno era ruim dava pouco, aí a gente ia se virando com o dinheirinho do cartão. A mãe dele às vezes ajudava nós, dava 10kg de arroz, goma, óleo. Apesar das dificuldades, o feijão e o arroz a gente sempre tinha”.

Para a família, o acesso a alguns itens era difícil. “Alguma verdura ou fruta só tinha quando eu ia pra rua no domingo pra comprar. Só comia banana de 8 em 8 dias, lá não tinha ninguém que vendia nada. Tinha uma vizinha que quando matava porco chamava nós, dava couro, torresmo, fazia chouriço, aí era melhor quando ela matava um porco e ajudava a gente. A gente bebia água quente, colocava numa ‘muringa’, enrolava com pano e ficava molhando. Quando o Iago era pequeno eu saia de casa ainda escuro, 4 horas da manhã, pra pegar leite pra ele. Era longe, eu ia de bicicleta”.

Para ir até a sede do município, Fátima dependia de carona. Se não aparecesse, o percurso era feito a pé. “Quando era pra ir pra cidade às vezes a gente ia para a estrada e não conseguia pegar carona, aí tinha que ir a pé. Saia 11 e chegava 2 horas da tarde. Lá na cidade tinha minha sogra, aí almoçava lá, ia tirar o dinheiro, que era 80 reais, e fazia a feirinha. De tardezinha eu pedia pra meu cunhado ir deixar nós lá. Já quando tava escurecendo a gente chegava lá com a feirinha de 80 reais. Naquele tempo 80 reais era dinheiro, fazia uma feira que comia um mês” disse.

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Ir à escola também era uma tarefa difícil para os filhos de Fátima. Sempre que seus pequenos saiam, a mãe ficava com o coração aflito. “Lá era muito longe para os meninos ir para o colégio estudar, no inverno também era ruim, eu tinha que encontrar eles nos caminhos com a água dando na cintura. Levava um pro outro lado, depois tinha que voltar pra pegar o outro. Foi muita dificuldade pra eles estudar, eles percorriam 6 km a pé pra ir à escola. Os dois iam sozinhos, aí toda vez que eles saiam eu ficava preocupada, enquanto eles não chegavam eu não me aquietava. Tinha dia que eu fazia a janta cedo e ia encontrar com eles no caminho, com medo de escurecer com eles sozinhos na estrada”.

Apesar das dificuldades, ela lembra que os filhos tinham muito interesse pelo estudo. “Eu acordava 4 horas da manhã pra acender o fogo pra fazer a merenda dos meninos antes deles irem pra escola. Eles tinham que sair todo dia 6 horas pra não chegarem atrasados. Quando chegava na estrada as vezes achava carona, outras não, se não pegasse ia a pé. Era longe, mas eles sempre tiveram interesse, nunca brigaram porque tinha que ir pra escola, eles tinham era vontade de aprender. Depois que eles cresceram mais viemos morar numa casa na estrada, que era mais perto do colégio, aí melhorou”.

Para dona Fátima, todo o esforço para que os filhos tivessem acesso à educação, foi compensado. “Eu agradeço a Deus, porque eles são inteligentes, hoje estão os dois formados. Não me arrependi do que fiz, de ir deixar e buscar eles na escola. Quando eles eram pequenos era sempre comigo, quando eu pedia para o pai deles ir encontrar eles no caminho, ele dizia ‘eu não mandei ninguém ir”. Se fosse pelo gosto dele, os meninos não sabiam nem do a. Eu que incentivei eles, com dificuldade, mas enfrentei”.

Depois de muito tempo morando no interior, a família mudou-se para a sede de Alegrete. Porém, o novo lar, infelizmente, foi marcado por uma tragédia. Manoel faleceu vítima de assassinato. Iago tinha 16 anos, e Patrícia apenas 10.

“Com o tempo nós alugamos uma casa na cidade e viemos embora. Mas quando tava só com 1 mês que nós tava aqui, Manoel foi morto. Eu fiquei ‘arriada’, chorei muito, ninguém esperava. E minha sogra quando soube da notícia, não resistiu. Aí no dia 1º de setembro, enterrou mãe e filho. Foi dois velórios, um na casa dela e outro na minha casa. Eu fiquei arrasada por muito tempo, não conseguia esquecer”.

Manoel partiu pouco tempo antes do casamento do filho. “Lembro que o Iago passou a noite todinha no pé do caixão. Nesse tempo ele já tava noivo, ia casar e fazer uma festinha, mas o Manoel morreu e aí tava todo mundo de sentimento, de luto, e não fizemos mais nada. E de lá a gente veio pelejando pra viver, fiquei terminando de criar eles. O Iago fazia muita coisa pela gente, trabalhava, trazia as coisas pra dentro de casa. Ele vendia sabonete, calcinha, saia vendendo um monte de coisa”.

Depois de trazer à memória alguns de seus dias de luta, Fátima encerrou agradecendo pelo que conseguiu vencer. “Mas apesar de tudo, eu sempre agradecia pelo que eu tinha. Graças a Deus hoje eu ‘tô bem’, Ele me deu oportunidade de sair do sofrimento e agradeço todo dia pelos meus filhos, por essa casa que eu tenho, o aposento e por tudo que a gente conseguiu vencer”.

Veja os Clicks do Mês de fevereiro:

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